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quinta-feira, 21 de agosto de 2014

Leite Materno não tem prazo de validade!

“Ela mama ainda? Nossa, já vai mamar de novo? Até quando essa menina vai mamar? Mas sai leite? Credo, acho tão feio criança grande mamando. Pra que ela mama ainda? É dependência da mãe, né? Nessa idade o leite não tem mais nada. Nossa, mas ela vai ficar muito dependente desse jeito.”

Estes são alguns dos comentários que toda mãe que amamenta uma criança além do primeiro ano de idade está cansada de ouvir. É só sair de casa, a cria pedir pra mamar que começam os olhares de reprovação, curiosidade, espanto e comentários. Pra não ser injusta muitas pessoas se espantam pro ‘bem’: “Gente, que gracinha! Que coisa boa! Ah, tem que aproveitar, né, eles crescem tão rápido!”. E esses comentários arrancam sorrisos orgulhosos da boca de toda mãe. Mas seja boa ou não, a reação diante de uma criança maiorzinha ao peito sempre causa estranheza e assombro.
Vivemos em uma sociedade onde a cobrança começa cedo, ainda mesmo antes de nascer. Os bebês tem hora pra nascer, hora pra mamar, hora pra sentar, engatinhar, andar, ir pra escola... Não há tempo para esperar o curso natural de desenvolvimento e paciência para esperar que a maturidade, a independência venha na hora certa, cada um a seu tempo. Essa independência gera tanta ansiedade em pais, avós, quem quer que esteja acompanhando o desenvolvimento de uma criança que muitas vezes impede que a dependência seja vivida de forma saudável e plena. Bebês são dependentes. Crianças pequenas são dependentes. E precisam ser, para assim aprenderem, aos poucos, em seu ritmo, a lidar com cada dificuldade que a vida lhes apresentar. Pois sabem que se precisarem, tem um colo, um peito onde se acalentar, onde recuperar sua confiança. O aleitamento prolongado traz a tona esse medo da dependência. Acreditam que se a criança não ‘larga do peito da mãe’ ela se tornará dependente da mesma enquanto o aleitamento existir.
Porém ao contrário do que o senso comum prega (e pasmem, muitos profissionais de saúde!) Manter o aleitamento materno até os 2 anos ou mais, respeitando o tempo natural de desmame da criança, enxergando-o como um processo fisiológico, natural e necessário permite que a criança cresça mais segura de si e independente, uma vez que a proximidade com a mãe a torna segura emocionalmente.
Sobre o leite ‘virar água’ ou não ter mais função após os 6 meses, ou 1 ano de idade, é outra afirmação totalmente infundada. Sabe-se que após o primeiro ano de vida o leite materno continua oferecer nutrientes de forma significativa à criança:
- 95% Vitamina C
-45% Vitamina A
-38% Proteínas
- 31% Gorduras  
Continuar amamentando constitui uma forte prevenção contra obesidade na infância e vida adulta!
Além dos componentes nutricionais, o leite materno é uma importante fonte de fatores imunológicos. Sabe-se que os fatores de imunidade do leite materno aumentam a medida que o bebe cresce e mama mais, inclusive durante a fase de desmame. Dessa forma, crianças amamentadas de forma prolongada recebem proteção contra doenças infecciosas, metabólicas, alérgicas na infância e na vida adulta. Mesmo quando adoecidas, crianças amamentadas apresentam melhor recuperação.

Cada vez mais estudos sobre os benefícios da amamentação e amamentação prolongada são realizados, comprovando sua importância e a necessidade de apoio e incentivo. Dessa forma o aleitamento não é apenas opção, porém questão de saúde para mãe e bebe.
Já passou da hora da sociedade voltar a enxergar o aleitamento materno da forma como ele é, algo fisiológico e natural, um momento de trocas, vinculo, nutrição, proteção e conforto para mãe e bebê. O momento do desmame é algo que cabe somente a mulher e sua cria, e deve acontecer no momento em que ambos percebam que estão preparados para tal, e não por pressão de terceiros (sejam familiares, desconhecidos, médicos ou qualquer outra pessoa). Muito além que vício ou mania, a amamentação prolongada garante nutrição para o corpo e para a alma.   

Luciana Morais, que amamenta uma mocinha há 2 anos , 4 meses e contando e já aprendeu fazer cara de alface aos comentários desnecessários.

Referências:
BORGES, L.S. [coordenador] Manual de aleitamento materno. Barueri, SP: Manole, 2013.
GOLDMAN,A.S. et al. Immunologic components in human milk during the second year of lactation. Acta F´aediatr Scand 1983; 722:133-34.

VICTORA, C. G. Et al. Is prolonged breastefinding associated with malnutrition? Am J Clin Nutr 1984; 39: 307- 14.

domingo, 17 de agosto de 2014

Teoria da Extero-gestação Para Bebês Novinhos


Os bebês humanos estão entre os mais indefesos de todos os mamíferos. Por causa do maior tamanho do cérebro e do fato de que o tecido nervoso necessita de mais calorias para se manter que qualquer outro, grande parte do alimento ingerido é gasto em prover nutrição e calor para as células nervosas. Mais significante é o fato de que nossos bebês necessitam nascer mais cedo do que deveriam, com seus cérebros ainda não totalmente desenvolvidos. Se o bebê humano nascesse já com o sistema nervoso central amadurecido, sua cabeça não passaria pela pelve estreita da mãe no momento do parto. Ao contrário de outros mamíferos, como girafas e cavalos, o recém-nascido humano é incapaz de andar por um longo período após o nascimento, porque lhe falta o aparato neurológico maduro para tanto. O custo primal de ter um cérebro grande é que nossos filhotes nascem extremamente dependentes e em necessidade constante de cuidado.

O crescimento do nosso cérebro após o nascimento é mais rápido do que o de qualquer outro mamífero e segue neste ritmo por 12 meses.

A seleção natural demanda que pais humanos cuidem de seus filhos por um longo período e que os filhos dependam dos pais. Esta necessidade mútua traduz-se em um estado emocional chamado “apego”.

Em algumas culturas, como na tribo !Kung, bebês raramente choram por longos períodos e não há sequer uma palavra que signifique “cólica”. As mães carregam os bebês junto ao corpo, com um aparato semelhante a um “sling”, mesmo quando saem para a colheita. A relação mãe-bebê é considerada sacrossanta, eles permanecem juntos o tempo todo. O bebê tem livre acesso ao seio materno e vê o mundo do mesmo ponto de observação que sua mãe.

Nossa cultura ocidental não permite um estilo de vida idêntico ao de tribos primitivas, mas podemos tirar lições valiosas sobre como ajudar nossos bebês na adaptação à vida extra-uterina.

Nos primeiros 3 meses de vida, o bebê humano é tão imaturo que seria benéfico a ele voltar ao útero sempre que a vida aqui fora estivesse difícil.

É preciso compreender o que o bebê tinha à sua disposição antes do nascimento, para saber como reproduzir as condições intrauterinas. O bebê no útero fica apertadinho, na posição fetal, envolvido por uma parede uterina morninha, sendo balançado para frente e para trás a maior parte do tempo. Ele também estava ouvindo constantemente um barulho "shhhh shhhh", mais alto que o de um aspirador de pó (o coração e os intestinos da mãe).

A reprodução das condições do ambiente uterino leva a uma resposta neurológica profunda "o reflexo calmante". Quando aplicados corretamente, os sons e sensações do útero têm um efeito tão poderoso que podem relaxar um bebê no meio de uma crise de choro.

Os 5 métodos para acalmar um bebê até 3 meses de idade são extremamente eficazes SOMENTE quando executados corretamente. Sem a técnica correta e o vigor necessário, não adiantam em nada.

1. Pacotinho ou casulo (embrulhar o bebê apertadinho)

A pele é o maior órgão do corpo humano e o toque é o mais calmante dos cinco sentidos. Embrulhadinho, o bebê recebe um carinho suave. Bebês alimentados, mas nunca tocados, freqüentemente adoecem e morrem. Estar embrulhadinho não é tão bom quanto estar no colo da mãe, mas é um ótimo substituto para quando a mãe não está por perto.

Bebês podem ser embrulhados assim que nascem. Apertadinhos, de forma que não mexam os braços. Eles se sentem confortáveis, "de volta ao útero". Bebês mais agitados precisam mais de ser embrulhados, outros são tão calmos que não precisam.

Se o bebê tem dificuldade para pegar no sono, pode ser embrulhado apertadinho, não é seguro colocar um bebê para dormir com um cueiro solto. Não permita que o cueiro encoste no rosto do bebê. Se estiver encostando, o bebê vai virar o rosto procurando o peito, ao invés de relaxar.

Todos os bebês precisam de tempo para espreguiçar, tomar banho, ganhar uma massagem. 12-20 horas por dia embrulhadinho não é muito para um bebê que passava 24 horas por dia apertadinho no útero. Depois de 1 ou 2 meses, você pode reduzir o tempo, principalmente com bebês tranqüilos e calmos.

2. Posição de Lado

Quanto mais nervoso seu bebê estiver, pior ele fica quando colocado sobre as costas. Antes de nascer, seu bebê nunca ficou deitado de costas. Ele passava a maior parte do tempo na posição fetal: cabeça para baixo, coluna encolhida, joelhos contra a barriga. Até adultos, quando em perigo, inconscientemente escolhem esta posição.

Segurar o bebê de lado ou com a barriga tocando os braços do adulto ajuda a acalmá-lo (a cabeça fica na mão do adulto, o bumbum encostado na dobra do cotovelo do adulto, com braços e pernas livres, pendurados). Carregar o bebê num sling, com a coluna curvada, encolhidinho e virado de lado, tem o mesmo efeito. Atualmente especialistas são unânimes em dizer que bebês NÃO DEVEM SER POSTOS PARA DORMIR DE BRUÇOS, pelo risco de morte súbita.

O bebê não sente falta de ficar de cabeça para baixo, como no útero, porque na verdade o útero é cheio de fluido e o bebê flutua, como se não tivesse peso algum. Do lado de fora, sem poder flutuar, virado de cabeça para baixo, a pressão do sangue na cabeça é desconfortável.

3. Shhhh Shhhh - O som favorito do bebê

O som "shhh shhh" é parte de quem somos, tanto que até adultos acham o som das ondas do mar relaxante.

Para bebês novinhos, "shhh" é o som do silêncio. Ele estava acostumado a ouvir tal som 24 horas por dia, tão alto quanto um aspirador de pó. Imagine o choque de um bebê acostumado a tal som o tempo todo chegando a um mundo onde as pessoas cochicham e caminham na ponta dos pés, tentando fazer silêncio!

Coloque sua boca 10-20 cm de distância dos ouvidos do bebê e faça "shhh", "shhh". Aumente o volume do "shh" até ficar tão alto quanto o choro do bebê. Pode parecer rude tentar "calar" um bebê choroso fazendo "shh", mas para o bebê, é o som do que lhe é familiar.

Na primeira vez fazendo "shhh", seu bebê deve calar pós uns 2 minutos. Com a prática, você será capaz de acalmar o bebê em poucos segundos. É ótimo ensinar isso aos irmãos mais velhos, que adorarão poder ajudar e acalmar o bebê.

Para substituir o "shhh", pode-se ligar:
- secador de cabelos ou aspirador de pó
- som de ventilador ou exaustor
- som de água corrente
- um CD com som de ondas do mar
- um brinquedo que tenha sons de batimentos cardíacos
- rádio fora de estação ou babá eletrônica fora de sintonia
- secadora de roupas ligada com uma bola de tênis dentro
- máquina de lavar louças

O barulho do carro ligado também acalma a criança.

4. Balanço

"A vida era tão rica no útero. Rica em sons e barulhos. Mas a maior parte era movimento. Movimento contínuo. Quando a mãe senta, levanta, caminha e vira o corpo - movimento, movimento, movimento."
(Frederick Leboyer, Loving Hands)

Quando pensamos nos 5 sentidos - visão, audição, tato, paladar e olfato - geralmente esquecemos o sexto sentido. Não é intuição, mas a sensação de movimento no espaço.

Movimento rítmico ou balanço é uma forma poderosa de acalmar bebês (e adultos). Isso porque o balanço imita o movimento que o bebê sentia no útero materno e ativa as sensações de "movimento" dentro dos ouvidos, que por sua vez ativam o reflexo de acalmar.

Como balançar ?
1. Carregando o bebê num "sling" ou canguru;
2. Dançando (movimentos de cima para baixo);
3. Colocando o bebê num balanço;
4. Dando tapinhas rítmicos no bumbum ou nas costas;
5. Colocando o bebê na rede;
6. Balançando numa cadeira de balanço;
7. Passeando de carro;
8. Colocando o bebê em cadeirinhas vibratórias (próprias para isso);
9. Sentando com o bebê numa bola inflável de ginástica e balançando de cima para baixo com ele no colo;
10. Caminhando bem rapidamente com o bebê no colo.

Quando balançar o bebê, seus movimentos devem rápidos mas curtos. A cabeça do bebê não fica sacudindo freneticamente. A cabeça move no máximo 2-5 cm de um lado para o outro. A cabeça está sempre alinhada com o corpo e não há perigo de o corpo mover-se numa direção e cabeça abruptamente ir na direção oposta.

5. Sucção

No útero, o bebê está apertadinho, com as mãos sempre próximas ao rosto, sugando os dedos com freqüência. Quando nasce, não mais consegue levar as mãos à boca. A sucção não-nutritiva é outra forma de acalmar o bebê. A amamentação em livre demanda não é recomendada somente para garantir a nutrição do bebê e a produção de leite da mãe, mas também para suprir a necessidade de sucção não-nutritiva. Alguns especialistas orientam às mães a darem chupetas para isso, mas ainda que a chupeta seja oferecida ao bebê, não deve ser introduzida nas 6 primeiras semanas de vida, quando a amamentação ainda está sendo estabelecida. Há sempre o risco de haver confusão de bicos e o bebê sugar o seio incorretamente.

É importante lembrar que o bebê nunca chora à toa. O choro nos primeiros meses de vida é a única forma de comunicar que algo está errado. Ainda que ele esteja limpo e bem alimentado, muitas vezes chora por necessidade de aconchego e calor humano. Por isso, falar que bebê novinho (recém nascido até 3 meses ou mais) faz manha (no sentido de chorar para manipular "negativamente" os pais) não tem sentido. Bebês novinhos simplesmente não tem maturidade neurológica para tanto.

Bibliografia:

The Happiest Baby on The Block, Dr. Harvey Karp, Bantam Dell, 2002. New York.

Our Babies, Ourselves: How Biology and Culture Shape the Way We Parent, Meredith F. Small, Anchor Books, 1998. New York.

Tradução: Flavia O. Mandic
Retirado da page Grupo Virtual de Amamentação do Facebook

sexta-feira, 15 de agosto de 2014

Mãe-mulher ou mulher-mãe ?

Por Gabrielle Faria

Quando  você dedica  tempo a seu filho e o que importa de verdade é a quantidade ou qualidade deste convívio?
e ou qualidade deste convívio¿ Qual o tempo que sobra pra ser mulher e como não  anular os sonhos pessoais e profissionais? Como não sentir culpa em ser mãe e não poder estar sempre presente?
As mulheres que são mães e que estão cada vez mais cedo no mercado de trabalho, são cada vez mais sobre carregadas com tarefas que exigem disposição, animo e tempo. São cobradas pela sociedade – e, as vezes, por si mesmas -a perfeição da criação.

E é o que as tornam o ponto central e foco de todo um contexto que exige, e muito de paciência e ponderação. Ter alguém pra cuidar e dedicar-se a algo que você queria muito acompanhar em tempo integral é, muitas vezes, frustrante e por isso questões como essas assombram, nós, as mães.

Mãe mulher ou mulher mãe, tão difícil definir o que é mais importante e se é que existe importância na ordem. Outro dia li uma frase que me chamou muita atenção “Antes de ser mãe eu fui e ainda sou mulher”, claro que na hora aquilo me despertou e me fez ver as coisas por um lado diferente com “um quê” de egoísmo ou talvez simplesmente o desejo de ser mulher. A sobre carga depositada em nós é tão intensa que muitas vezes temos a sensação de abrir mão de cuidados e vontades próprias para dedicar a um filho, ou simplesmente os sufocamos de atenção desnecessária e tiramos a sua individualidade, depositando neles os anseios mais enigmáticos que temos tanto na forma emocional e material.

Não existe culpa a ser dividida. Por mais que um homem faça o papel de pai e divida tudo com a mulher ele nunca será uma mãe. Nós carregamos, amparamos, cuidamos, não dormimos e pensamos neles a  todo o momento. Quando se tem uma criação baseada no apego, a relação entre mãe e filho é perfeita e isso independe se a mãe está em casa o dia todo ou está em um escritório longe da cria. A culpa não se divide porque ela não deveria existir na verdade. São apenas sentimentos de medos por um possível erro que nem chegou a acontecer.
Não tem formula certa, nem medidas precisas. O tempo é a resposta pra todas as perguntas e a chave que abre todas as portas é o amor, que se tem a vida gerada.


 Então como experiência de mãe que trabalhou fora numa escala de quase 13 horas diárias e pouco via a filha eu só tenho a dizer que : o amor, a paciência, a resiliência e o emponderamento  são a base que levo comigo depois de tanto me culpar e martirizar por não ter estado nos momentos que queria estar. Por mais que tenha tido a ausência física hoje vejo que era o certo e o melhor pra mim e para eles, então não me penalizo. Que se viva o hoje com apego e liberdade para os filhos e a nós mães mulheres ou mulheres mães.

quarta-feira, 13 de agosto de 2014

Mas afinal, o que é parto humanizado?

"Na verdade não há um consenso sobre o que é parto humanizado e há muito preconceito também, especialmente entre profissionais que se recusam a sair do modelo "eu faço partos há 20 anos, não é você quem vai me ensinar". Entre essa categoria mais engessada, a fala em geral é: "se eu não faço parto humanizado, eu faço o que? parto de bicho?". Em uma coisa eles têm razão, esse nome não diz nada! O que faz diferença na assistência humanizada verdadeira é a atitude de todos. Por isso, se o seu profissional prioriza o conjunto te preceitos enumeradas abaixo, ele é um profissional humanizado, dentro desse conceito de humanização. 

Vamos a eles! O Parto Humanizado é:

1) Respeito aos tempos da mãe e do bebê. Qualquer aceleração do processo, quer indução, aumento artificial das contrações ou agendamento de cesariana precisa de uma forte justificativa clínica. Não faz sentido marcar a cesariana porque a mãe está pesada, e entender isso como "protagonismo feminino". Existem várias possibilidades de ajuda para uma mãe cansada, e que não desrespeitam o tempo do bebê.

2) Respeito ao protagonismo feminino. É importante mudar o olhar e compreender que o parto é da mulher e que ela tem direito a escolhas e total liberdade. Esse é talvez o maior desafio dos profissionais e dos serviços. A cada vez que alguém se dirige à mãe e se diz o que ela deve fazer, já houve um desrespeito a esse protagonismo. Um exemplo básico, se a mãe chega na triagem e alguém diz: "por favor, mãezinha, a senhora vai ali naquele banheiro, tira toda a roupa e coloca essa camisolinha voltada para trás".. BANG! Matou o protagonismo! Essa talvez é a maior mudança de mentalidade necessária e a origem de todas as outras mudanças.

3) Compartilhamento de responsabilidades. O médico não proíbe, não aconselha, não manda. O médico ou a parteira ou qualquer outra pessoa da equipe mostra sempre as opções e a mulher escolhe o que ela quer para ela. Mesmo quando parece não haver opção, há opção. E já que não existem garantias mesmo, o melhor é ser claro, mostrar riscos e benefícios e permitir que a mulher sinta que está sendo co-responsável por suas escolhas. Por exemplo: "Sim, você pode tomar analgesia, mas existe um pequeno risco disso repercutir para o bebê, ou você pode tentar ficar mais um pouco na banheira, ficar lá com o seu marido e ver se consegue aguentar mais um pouquinho. Quem sabe possamos reavaliar daqui a 1 hora e já vai estar bem mais perto de nascer?"

4) Uso das melhores evidências. Depois de 30 anos de evidências contra o uso rotineiro de episiotomia, não cabe afirmar que a episiotomia protege a mulher. Hoje em dia existem claras evidências de que o melhor é deixar o parto acontecer naturalmente, sem qualquer tipo de intervenção, no ambiente mais simples possível, com equipes igualmente simplificadas.

5) Levando tudo isso em consideração, apesar de que uma ou outra mulher possa precisar de analgesia, ou de rompimento artificial da bolsa das águas, ou um pouquinho de ocitocina em algum momento, a imensa maioria das mulheres de baixo risco terá, dentro desses princípios todos, um parto:- De início espontâneo, sem indução- Sem precisar subir em cadeira de rodas ou macas até a sala de parto- Sem precisar usar uniformes específicos- Em um ambiente simples, sala agradável (chamadas de PPP), com mobília adequada, com banheira e chuveiro disponíveis, luz baixa, música a gosto e total privacidade- Atendido por uma obstetriz, enfermeira obstetra e/ou médico- Sem o uso de ocitocina durante todo o trabalho de parto- Sem raspagem dos pelos pubianos e/ou a abjeta lavagem intestinal- Com liberdade de alimentação e ingestão de líquidos- Sem o uso de cardiotocografia contínua, tendo o coração do bebê avaliado intermitentemente com um sonar simples, a intervalos regulares de tempo- Com apoio contínuo do(s) acompanhante(s) e de uma doula particular- Com o uso de métodos não farmacológicos para dor- Com o uso de analgesia se necessário, depois de informada dos riscos e benefícios- Sem ruptura artificial da bolsa das águas- Com absoluta liberdade de movimentos para a mãe durante todo o processo, inclusive durante o período expulsivo- Encorajamento das posições verticalizadas- Sem episiotomia, sem empurrar a barriga, sem dedos nervosos na vagina da mulher, sem prender a respiração para fazer força comprida, sem fórceps, sem vácuo-extrator para acelerar um processo em que mãe e bebê estão bem- Sem limites arbitrários de tempo para o parto e para o período expulsivo, porque o bebê "ainda está alto", por exemplo- Com o bebê sendo colocado imediatamente no colo da mãe com o cordão ainda ligado, mantido intacto pelo menos até parar de pulsar, e com amamentação a mais precoce possível- Sem aspiração das vias aéreas do recém nascido, separação da mãe, colírio e identificação só após a primeira mamada, vitamina e vacina só depois de algumas horas e após tempo para o vínculo mãe-bebê- Com o uso de alojamento conjunto desde a sala de parto até o final da estadia

6) O uso de uma intervenção (ou mais, se necessário) não tira o aspecto humanizado do parto. Desde que seja necessária no contexto e de que seja dada a escolha para a mãe, desde que seja, portanto, utilizada em caráter de exceção. E no final, até mesmo uma cesariana pode ser necessária, e ainda assim é perfeitamente possível ser calmo, falar baixo, respeitar mãe e bebê sem falar de outros assuntos, baixar a luz, aquecer o ambiente, e obedecer aos três últimos princípios, que ocorrem depois do nascimento.Em suma, o parto humanizado é um parto o mais natural possível, com o menor número de intervenções que for possível para aquela dupla mãe-bebê e onde cada intervenção só seja utilizada quando os seus riscos forem menores do que o risco de não utilizá-la; onde os tempos, os interesses e a liberdade da mãe e do bebê sejam os principais motivadores de todos os envolvidos; e o melhor: tudo baseado em evidências científicas e nas recomendações da Organização Mundial da Saúde."

Ana Cristina Duarte, Obstetriz